sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Agora pai de Arthur, João Marcello Bôscoli lembra com carinho dos pais


Desde o chocolate com leite preparado pelo pai, à chegada surpresa da mãe depois de uma viagem, João Marcello lembra-se dos pais cheio de carinho
Lembro da cor da sua pele, o som da sua voz e o cheiro do seu armário. Lembro dela me acordando da soneca com um carinho. Ela se aproximava delicadamente ao lugar onde eu estava dormindo: dentro do bumbo da bateria. Eu adorava dormir lá dentro.
Lembro da sua colônia pós-barba, e a cor rosa de seu suéter. Era meu pai,  preparando um chocolate com leite. Usava primeiro um liquidificador, depois uma batedeira pra ficar com bastante espuma; algo que eu também adorava.
E nunca esqueço do meu irmão mamando e eu pedindo pra minha mãe me dar um pouquinho do leite, que, aliás, eu achei ruim…
aos nove anos de idade eu estava tomando sol na praia, de olhos fechados, meio dormindo, sentindo muita saudade dela. De repente, veio uma sombra, quando abri os olhos era minha mãe, sorrindo pra mim. Tinha chegado de Los Angeles sem avisar. Esses segundos são eternos. E continua sendo um dos melhores momentos da minha vida.
Lembro-me da alegria contagiante da minha mãe quando me mostrou a minha irmã, Maria Rita, no berço. Ela estava muito feliz por ser uma menina: achava que seria um menino até a hora do parto.
Com a morte da minha mãe, gastava todo meu tempo tentando ser feliz através da música e com os meus amigos. Sempre fui muito, muito arteiro, e assim tive momentos de muita felicidade, apesar das circunstâncias.
As influências mais fortes que ficaram foi a fé no ser humano, em mim mesmo, no meu ofício e em Deus, desligada de ditames religiosos. O gosto pela leitura, pelas artes e ciências de uma maneira ampla, e no amor como única força realmente transformadora. Eles me davam a sensação de que eu era especial, de alguma forma. Coisa de mãe e pai.
Quando olho para a trajetória da minha vida, reconheço, sim, muitas coisas em comum entre mim e eles. Posso destacar o amor e a admiração pela natureza, na perfeita acepção do termo. Seu design, amarrando forma e função, me encanta diariamente. Passei a maior parte da minha infância morando no campo e de frente ao mar. Não há nada que o homem faça que a natureza já não faça há mais tempo e melhor. Está tudo nela.
A bossa nova e Sinatra lembram muito o meu pai. O som da sua voz imitando o Sinatra falando. Inesquecível. Ele gostava tanto que dizia brincando “eu inventei gostar de Frank Sinatra no Brasil”.
Com a minha mãe, eu adorava escalar a sua biblioteca e jogar os livros escolhidos no chão. Uma vez descobri uma Mafalda autografada pelo Quino e pensei: “Pôxa, minha mãe deve ser importante mesmo!”
O primeiro filme assistido por nós dois foi West Side Story, em casa, em um projetor. Fiquei encantado.
Nada na minha mãe eu desgostava; não tive tempo pra isso. Do meu pai, ficava preocupado com sua falta de diplomacia. Era muito engraçado, mas desesperador em alguns momentos.

Agora, eles estão em seu devido lugar: dentro do meu coração. Todavia, nunca houve um dia onde não pensasse neles por alguns segundos. E olhando pro Arthur, estou também olhando pra eles. Por mim, por eles e pra ele.
João Marcello Bôscoli, pai de Arthur, é produtor musical e empresário, fundador da Trama, trama.uol.com.br
*Pais & Filhos*

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