segunda-feira, 27 de junho de 2011
João Marcello Bôscoli fala sobre a parternidade, o Ecad e homenagens à mãe, Elis Regina.
Revelar novos artistas, democratizar a cultura musical e buscar novas tecnologias são tarefas às quais João Marcello Bôscoli se dedica cotidianamente. Há 13 anos no comando da gravadora Trama, o produtor enche a boca para falar das conquistas alcançadas. O Álbum Virtual é uma delas: discos inteiros que podem ser baixados de maneira legal e gratuita. Estudioso das tendências mundiais do mercado fonográfico, diz que a crise do disco pré-gravado era previsível. Nascido em berço musical (filho de Ronaldo Bôscoli e Elis Regina) e prestes a ser pai pela primeira vez, programa para o ano que vem uma série de homenagens a sua mãe. “Acho que é uma maneira de devolver à sociedade um pouco do trabalho dela”. Abaixo, trechos da entrevista.
Como a Trama lida com a mídia digital e a pirataria? Já sabíamos que haveria uma expansão da música. Dois anos antes do Myspace, em 2003, lançamos uma ferramenta de autopublicação de músicas, a Trama Virtual. Fizemos isso porque arquivávamos muitos demos. Chegamos a ter seis mil. Não dá para lançar seis mil artistas por ano. Por isso criamos uma vitrine virtual. Temos também download remunerado, em que cada vez que uma música é baixada, uma marca paga para o artista.
Como funciona o Álbum Virtual? Quais são as vantagens? É uma solução para o mundo digital. Nele existe direção de arte, a sequência das músicas. O artista tem o controle da qualidade da obra. Ficamos felizes porque um ano e oito meses depois, a Apple lançou o iTunes LP, mostrando que estamos no caminho certo.
Você compra CD? Compro. Mas claro, houve uma crise específica no formato do disco pré-gravado. Mas isso já estava desenhado. Se a mídia física vai continuar existindo, é uma decisão da sociedade. Me parece que as pessoas têm uma relação especial com algo físico. A fita cassete, por exemplo, está começando a voltar. Agora, o show, a camiseta, o boné… isso é para sempre.
Acha que esse contexto é melhor para os artistas? Acho que sim. É muito mais barato produzir um disco hoje em dia. Além de ser possível publicar o álbum na rede sem perguntar nada para ninguém. No que diz respeito aos rendimentos financeiros, os shows sempre foram mais importantes. O que pagou minha escola foram os show da Elis e não os discos dela.
Falando em Elis, você está programando uma série de homenagens para ela. Temos várias iniciativas. Entre elas, uma exposição para o ano que vem e um documentário que já está pronto. Mas as atividades ainda estão em processo de captação e autorização.
Qual é o significado disso? É maravilhoso. Independentemente de ser minha mãe, gosto da obra da Elis Regina. Acho que é uma maneira de devolver para sociedade um pouco do trabalho dela.
Por conta do projeto, tem escutado muito as músicas dela? Esses grandes nomes a gente escuta sempre, mas com parcimônia. Porque é uma obra vasta, linda, mas finita. Existem períodos certos para escutar (risos).
Como você reage quando alguém te procura para fazer algo com relação à obra de Elis? O nosso papel de herdeiro é liberar. Se alguém quer fazer, só damos uma olhada antes, mas costumamos aprovar. Por mim, quanto mais, melhor.
Como produtor musical, qual é a sua opinião sobre o Ecad? Acho que o método de arrecadação pode melhorar. Sobretudo em uma estrutura burocratizada como é no Brasil. Pessoas mais experientes do que eu, que participaram da Ecad, dizem que antes era pior porque não era centralizado. Na prática, claro, existem muitas falhas.
Então você é a favor da existência desse órgão? Não existe muita variação para o Ecad. É necessário, em algum momento, que uma entidade faça a gestão do acervo musical. Pode melhorar, mas não dá para deixar de existir. Ou cria-se outra entidade com uma função muito parecida. Como já existe, me parece que é melhor refinar.
Em que aspectos você acha que pode melhorar?
Acho que os artistas deveriam ter o direito de gerir sua própria obra. Quando se fala em radio teledifusão pública, o artista – independentemente de ser dono de sua obra – precisa consultar o Ecad. Esse é um aspecto que eu acho notoriamente negativo. O aspecto positivo é que o Ecad congrega entidades que estão aí para arrecadar e repassar.
Como avalia a Ana de Hollanda no MinC? Acho muito cedo para avaliar. O que eu percebo é que as pessoas esperavam menos. Achavam que ela ia ser mais suave, quase decorativa. Mas tem se mostrado uma pessoa de opinião. Pessoalmente quem eu gostaria ver como ministro da Cultura é o Danilo Miranda, do Sesc. Não é só porque ele gosta de arte, mas por sua experiência administrativa.
Há muita polêmica envolvendo projetos que usam leis de incentivos fiscais do MinC. Na sua opinião, a lei é boa? O que entendo das leis de incentivo: 4% do lucro de uma empresa que pode ser investido em cultura. Os outros 96% ela tem que pagar o imposto normal. É um dinheiro importante para uma pasta de orçamento tão baixo. Acho um bom recurso, apesar da Trama só ter usado uma vez. Agora, a discussão dos critérios para esses 4% é subjetiva. Alguns dizem que é dever do ministério escolher quem pode usufruir. Outros defendem que essa função deveria ser da empresa que irá fomentar.
Acha que a polêmica em torno do caso de Maria Bethânia foi desnecessária? A Bethânia está dentro da lei. E de uma lei que eu acho válida. Na minha opinião, ela não merecia essa hostilidade.
Além da Elis, existe um documentário em produção sobre seu pai, Ronaldo Bôscoli. Achei fantástico. É raro alguém querer fazer algo sobre um compositor, um produtor. Mateus Solano foi ótimo interpretando meu pai na série Maysa. Ele fez os trejeitos iguaizinhos.
E você está se preparando para ser pai pela primeira vez… Estou achando essa experiência maravilhosa. Aproveito muito todos os dias. Tenho 41 anos e estou conseguindo viver cada etapa do crescimento de uma maneira muito intensa. É profundamente emocionante e mágico.
*Sonia Racy – Estadão*
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